É raro chorar. Ensinaram-me que a tristeza era fraqueza e até hoje me ficou esse instinto. Quando choro, choro de desespero; profundo, angustiado, físico e visceral. Mas sempre com timidez e, por isso, em silêncio para não perturbar o mundo a quem o meu choro nada alimenta.
Fui-me avolumando pela vida, mas na realidade só cresci nos últimos anos. Tudo antes era instinto, desaforo, inconsequência, voragem. Refletido e consciente nas consequências, volitivamente ignorante no passo em frente. Num mecanismo coerente na sua contradição, vivi ainda assim em análise constante, num périplo que consoante dava jeito rodava de Kant para Hegel para Platão para (óbvio) Nietzsche.
Ao sair de mim (o que é aprender senão considerar o outro?) fui-me cedendo terreno, encontrando escalas de cinza que afinal também me podiam perdoar. Aprendi a rir-me na e da minha própria cara, aprendi a pedir ajuda, aprendi a obrigar-me a ser frágil. Aprendi a chorar em frente de quem me vai ainda amparando. Mas sempre em silêncio. Como quem pede ajuda e desculpa em simultâneo.
Lembro-me de todas as vezes em que, sem escolha, subi penhascos metafóricos e literais para gritar o meu choro até não sobrar sequer ar para respirar. Fi-lo sempre só, tanto por escolha como por inevitabilidade. Como se entregasse o destino ao universo. Como se apenas pudesse permitir-me dar voz às minhas dores perante a imensidão infinita do mundo a quem seriam garantidamente indiferentes e, por isso, inócuas.
Quando desço do penhasco, se ainda caírem lágrimas, vêm caladas. Sempre caladas.
Blue Notes 